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Lula e o jogo eleitoral para 2022

por Moisés Morais

Fonte: https://diariodocomercio.com.br/

O temor das elites pela apresentação de Lula como candidato à Presidente da República não é novidade. Foi assim em 1984-85 quando se deflagrou a campanha Diretas Já e o receio de que o voto popular pudesse tornar o primeiro presidente civil pós-ditadura militar um representante politico, como Lula ou Brizola, cuja base social era formada por opositores do regime ditatorial ou segmentos empobrecidos da população que demandavam politicas públicas em seu favor.

Mesmo em 2002, apesar do diálogo público e de bastidores com os donos do dinheiro e a presença de José Alencar como candidato à vice-presidente, não foi consenso das elites apoiar o petista. O dólar subiu e a bolsa desceu, na histeria de sempre dos especuladores do mercado financeiro, embora existisse a presença de José de Alencar como um fiador da classe patronal na chapa e o PT naquele momento não ser mais nem a sombra do que fora na década de 1980. Eleito, Lula não deu nenhum cavalo de pau e manteve as bases da politica econômica do seu antecessor, sem desagradar o mercado financeiro. Os bancos bateram recordes de lucros, lembremos.

Mas, se os governos petistas não desagradaram os interesses das elites locais e estrangeiras, por que em 2016 foi urdido um golpe branco que retirou Dilma Roussef do poder e dois anos depois um contorcionismo jurídico levou Lula à prisão, retirando-o do páreo eleitoral? Bem, nesse período se vivia outra situação conjuntural, em que, diante da crise econômica em andamento, o grande capital, com o objetivo de reativar em uma escala progressiva a sua margem de lucro, exigia um ajuste fiscal radical, reformas e privatizações que permitissem acessar os recursos públicos ou atuar em atividades até então desenvolvidas pelo Estado.

o programa de governo a ser apresentado por Lula tende a estar muito mais à direita do que os que foram construídos pelo PT

Nesse contexto, Dilma, Lula ou Haddad, por mais porosos que sejam a agenda liberal, passaram a ser um empecilho, pois teriam dificuldades de entregar um ajuste fiscal, reformas e privatizações na velocidade e na abrangência reivindicada pelo mercado, uma vez que essas medidas entrariam em uma flagrante contradição com as demandas da base eleitoral petista formada, principalmente, por trabalhadores (as). Diante desses interesses, Jair Bolsonaro se tornou uma alternativa politica real, tendo Paulo Guedes como principal interlocutor dos reclames do mercado.

E a eleição presidencial de 2022? Dizia Magalhães Pinto, político mineiro que apoiou o golpe de 1964, que política é como uma nuvem, a cada momento que você a observa, ela muda de forma. Para o caso Lula, ao invés da metáfora da nuvem talvez seja preferível dizer que a política não gira, capota! Esse trocadilho parte da constatação de próceres da direita liberal brasileira e parcelas da grande mídia tem assimilado sem estranhamento a possibilidade de Lula disputar a eleição de 2022 com capacidade de derrotar Jair Bolsonaro. Ou seja, aqueles que endossaram a prisão de Lula e a eleição de Bolsonaro, podem de agora em diante se alinhar com o petista.

Desse modo, torna-se factível a volta de Lula para a presidência da República, diante da catástrofe que está sendo promovida pelo governo Bolsonaro. A cada dia mais um recorde de mortes devido à negligência com os efeitos da pandemia. Ao mesmo tempo, a atividade econômica despenca, única questão que sensibiliza aos abutres do mercado, que enxergam o mundo somente a partir do movimento dos números, cifras e dos pontos e vírgulas entre os dígitos do saldo bancário.

Lula pode voltar a ser presidente da República, resultado da confluência entre a rejeição do eleitorado afetado pelo desastre existente na saúde pública e na economia, com a leitura dos donos do dinheiro que passam a considerar que Bolsonaro e Guedes deram o que poderiam dar. Mas uma questão relevante a ser pensada é como, uma vez eleito, Lula vai lidar com os interesses divergentes do mercado, da classe média e da população trabalhadora, em uma situação econômica muito mais adversa do que a que se apresentava em 2002 quando foi eleito pela primeira vez.

A crise econômica se aprofundou e apesar da anulação das condenações, enquanto não houver prescrição, os processos podem ser reabertos contra Lula e utilizados como freio para qualquer iniciativa no sentido de desfazer o desmonte de direitos promovidos por Temer e Bolsonaro. Dito de outra forma, o programa de governo a ser apresentado por Lula tende a estar muito mais à direita do que os que foram construídos pelo PT nas últimas duas décadas e isso poderá ser tolerado pelo seu eleitorado, pois há um bode na sala que precisa ser retirado. Ou mais que isso, há um genocida viúvo do AI-5 que urge perder a faixa presidencial.


Moisés Morais é Historiador e Professor. Mestre em História pela UNEB.

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